Economia
20/03/2025Investimento na economia digital é essencial para Brasil competir globalmente
País tem oportunidades nas áreas de Tecnologia e Sustentabilidade, mas precisa lidar com entraves estruturais, como investimentos insuficientes e regulação inadequada

A AI Economy, ou economia da Inteligência Artificial, já está transformando os setores sociais, econômicos e produtivos em todo o mundo. O seu enorme potencial afeta a produção de bens e serviços, influenciando a criação de novos mercados e aumentando as oportunidades de negócios. “A AI Economy está sendo a maior janela de prosperidade da nossa e de todas as gerações pós-Segunda Guerra”, afirma Gil Giardelli, membro do Comitê AI for Developing Countries Forum. O especialista foi um dos convidados da reunião conjunta entre os conselhos de Economia Digital e Inovação e de Sustentabilidade, da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), realizada no dia 14 de março.
A automação de tarefas, a criação de novos cargos, o aumento da produtividade e o incentivo ao crescimento econômico, além da maior competitividade entre empresas e países, promoverão uma transformação relevante no desenvolvimento econômico mundial. Por isso, os países que se posicionarem estrategicamente e investirem nesse campo poderão se tornar líderes, enquanto aqueles que não se adaptarem correrão o risco de ficar para trás. O tema foi um dos pontos discutidos no encontro, que debateu as oportunidades no mercado de data centers, além do papel da IA nas mudanças climáticas e na promoção de práticas ESG.
Durante a reunião, Andriei Gutierrez, presidente do Conselho de Economia Digital e Inovação da FecomercioSP, ressaltou que a sociedade está transitando de um modelo predominantemente industrial e manufatureiro para um essencialmente digital. Nesse contexto, as organizações e os países lidam com impasses que afetam a todos, mas há tópicos estruturais, como a emergência climática e a desigualdade social. “Isso nos obriga a ter um olhar mais atento às questões de inclusão e aos desafios relacionados à transformação digital, como a governança”, comentou. Nesse cenário, a segurança, a privacidade e o manejo responsável da IA se destacam como as principais questões.
Com a AI Economy, o Produto Interno Bruto (PIB) de um país passa a ser avaliado não apenas pela quantidade de recursos materiais que este dispõe, mas também pela presença e aplicação da IA. Giardelli destacou que a IA foi reconhecida como uma nova forma de riqueza global e que, só no ano passado, o seu valor superou em 25% o PIB dos Estados Unidos.
Mas se o impacto da ferramenta supera até a maior potência econômica do mundo, a distribuição dessa riqueza ainda é desigual, principalmente quando se trata do Hemisfério Sul, para onde muito pouco desse montante foi direcionado.
Investimentos insuficientes
No âmbito dos recursos aplicados em tecnologias emergentes, como a computação quântica, o Brasil, por exemplo, está em descompasso com nações como a Austrália e a China — esta última com aportes na ordem de US$ 15 bilhões, enquanto o País tem uma iniciativa muito pequena, de apenas R$ 6 milhões. “Precisamos realmente acordar para essa nova era”, afirmou o especialista, sobre a necessidade de o Brasil investir mais no setor para não ficar atrás das potências globais.
Ele afirmou ainda que a IA é cada vez mais capaz de realizar tarefas complexas de forma autônoma, tornando-se indispensável em diversos setores. Cães da raça pastor-alemão, aposentados por idade, estão sendo substituídos por ciborgues e robôs, que já atuam no Metrô de São Paulo e na Polícia de Nova York. Em fábricas, algoritmos avançados podem detectar o início de incêndios, ajudando a prevenir desastres. Além disso, muitas dessas tecnologias, incluindo IA e automação, estão sendo aplicadas para reduzir problemas ambientais, como a poluição dos oceanos, ao mesmo tempo que estimulam oportunidades de negócios e inovação tecnológica.
No contexto atual, é preciso uma nova abordagem da economia que foque em sistemas e processos que não apenas preservem, mas também regenerem recursos naturais e sociais, unindo a tecnologia com a natureza para proporcionar soluções mais sustentáveis e eficientes na resolução de problemas. Além disso, a nova era de inovação, com cada vez mais empresas baseadas em tecnologias disruptivas — como as startups que requerem avanços científicos e tecnológicos profundos (a fusão nuclear, por exemplo) —, necessitam de pesquisas avançadas e investimentos substanciais. “O que nos preocupa é que o Brasil não está navegando nessa nova era”, pontuou Giardelli.
Potencial estratégico no mercado de data centers
Um exemplo de oportunidade que o País poderia aproveitar melhor são os data centers. Enquanto países como os Estados Unidos já investem nessas estruturas, cientes de que serão ainda mais indispensáveis no futuro, o Brasil ainda não está tirando proveito de todo o seu potencial.
A maior parte dos serviços digitais utilizados diariamente, por meio de celulares e outros dispositivos do gênero, dependem de uma infraestrutura externa para funcionar. O arcabouço que mantém o mundo moderno está diretamente ligado a esses prédios gigantes, conhecidos como data centers, que funcionam 24 horas por dia, sete dias por semana, com ar-condicionado, energia, monitoração e fibra óptica sempre disponíveis.
Agostinho Villela, vice-presidente de Engenharia da Scala Data Center, explicou que, apesar da explosão da computação em nuvem, com mais dados sendo trafegados e armazenados, o consumo de energia não aumentou significativamente nos últimos anos graças a processadores mais rápidos e práticas mais eficientes. Contudo, segundo ele, a crescente demanda por transferência de dados e velocidade de computação tende a elevar esse número nos próximos anos. Metade dessa alta será em resposta às necessidades das empresas industriais, que exigirão grande poder computacional para as operações.
O especialista ainda esclareceu que, atualmente, a indústria de data centers consome cerca de 30 gigawatts (GW) médios de energia, o que equivale a dois terços do consumo médio do Brasil, que fica entre 60 e 70 GW médios (com picos de até 100 GW). Entretanto, considerando as perdas energéticas e o consumo elevado com ar-condicionado, esse número pode chegar a 60 GW médios, aproximando-se do consumo total do País. Segundo a Agência Internacional de Energia (IEA), data centers (excluindo telecomunicação) consomem cerca de 2% da eletricidade do mundo e estimativas indicam que, entre 2023 e 2030, a demanda global por energia crescerá 190%, o que pode resultar em um consumo de Tecnologia de Informação (TI) de 108 GW médios. “Em outras palavras, é uma indústria que gera muito valor para a sociedade, mas, obviamente, tem uma alta demanda energética”, pontuou Villela.
Para o Brasil, esse cenário pode representar tanto um desafio como uma oportunidade, já que a disponibilidade de energia passará a ser determinante na localização desses data centers. Cerca de 93% da eletricidade nacional são oriundos de fontes renováveis, o que coloca o País em uma vantagem competitiva em comparação com as nações do G20, por exemplo. Segundo Villela, o Brasil poderia aproveitar a energia renovável e as subestações com capacidade disponível, raras em outros países, para exportar serviços computacionais, principalmente de IA. “Se o Brasil exportasse 6 GW [médios] de computação, estaríamos falando de US$ 60 bilhões de investimento em infraestrutura digital, US$ 242 bilhões no total. Isso moveria o ponteiro e o PIB, mudando o País”, concluiu.
Ademais, o desenvolvimento de biocombustíveis, explorando alternativas como o óleo vegetal hidrotratado (HVO), é uma das possibilidades para a Nação se destacar nesse mercado, uma vez que data centers utilizam geradores a diesel (em caso de falhas na rede elétrica principal), o que aumenta a pegada de carbono. Iniciativas do governo federal — por exemplo, a Lei do Combustível do Futuro, que incentiva o desenvolvimento do diesel verde, como o HVO no cenário nacional — são muito bem-vindas.
Além das questões ambientais, a infraestrutura digital impulsionaria a economia nacional, criando também empregos altamente qualificados (diretos e indiretos) nessas indústrias. Entretanto, os entraves a área ainda são grandes, como o custo elevado da energia elétrica — em razão da tributação e, sobretudo, dos subsídios —, a necessidade de investimentos em infraestrutura e as discussões regulatórias. “Existem questões ambientais nos Estados Unidos, somadas ao tempo de conexão de grid, que podem ser oportunidades interessantes para o Brasil, particularmente quanto à IA, em que a latência não é tão crítica”, afirmou Villela, sobre as vantagens nacionais. “Mas o Brasil, por sua vez, precisa se ajudar — o que, infelizmente, não acontece quando cria uma lei de IA que pode ser percebida como adversa aos investimentos estrangeiros”, concluiu.
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Clique no link a seguir e confira as palestras do segundo painel “Inteligência Artificial como Motor das práticas ESG: Transformando Dados em Ações Sustentáveis”.
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