Sustentabilidade
27/05/2024Agenda Verde: os impactos ligados aos PLs de Energia
Especialistas avaliam os projetos de contenção do encarecimento das contas, do hidrogênio verde e da geração energética offshore; entenda
A transição energética consiste em passar de uma matriz de fonte de energia que utilize combustíveis fósseis, como petróleo, gás natural e carvão mineral — grandes emissores de Gases de Efeito Estufa (GEE) e outros poluentes na atmosfera —, para fontes renováveis, como sol, água, vento e biomassa, que emitem menos GEE.
O compromisso dessa transição foi o destaque da COP28 de 2023 em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos. O inventário global de emissões produzido estabelece a necessidade de triplicar, até 2030, em nível mundial, a capacidade de energia renovável e dobrar a taxa média de melhorias na eficiência energética. Essas medidas são consideradas fundamentais para manter o aumento da temperatura em 1,5ºC até o fim deste século, conforme determina o Acordo de Paris.
Todos os impactos do aquecimento global vêm tornando os consumidores mais engajados com a sustentabilidade e exigindo atitudes consistentes e urgentes das empresas. Segundo a pesquisa da Future Consumer Index (FCI), 30% dos consumidores brasileiros consideram que o uso de energias renováveis é a principal questão em termos de sustentabilidade a ser resolvida pelas companhias. Na sequência, com 28%, vem a redução das emissões de GEE e também a diminuição da poluição da água e do solo. Em quarto lugar, as embalagens sustentáveis foram apontadas com 24%.
A questão no Brasil
Em termos de sociedade, os consumidores brasileiros apontam as seguintes questões a serem enfrentadas: combate das mudanças climáticas e dos seus impactos (29%); proteção dos ecossistemas sustentáveis e da biodiversidade (28%); e manutenção de água potável e promoção do saneamento básico (26%). Além disso, 52% sentiram o encarecimento da energia e 51% dos produtos, impactados pelas mudanças climáticas.
Dados apontam ainda que o Brasil está em posição privilegiada em relação a outros países, como Estados Unidos, China e os europeus. O último Balanço Energético Nacional de 2023 mostrou que o País dispõe de uma matriz energética entre as mais renováveis do mundo: mais de 47%, contra cerca de 15%. Quanto à energia elétrica, a renovabilidade é ainda maior, quase 88%. De toda a oferta interna, 33% da energia é consumida no transporte de cargas e passageiros; 32% pelo setor industrial; 10,7% pelo setor residencial; 4,8% pela agropecuária; 5% por comércios e serviços; e 5,9% por usos não energéticos. Já os setores industrial, de transportes e residencial consomem, respectivamente, 62%, 21,5% e 70,7% de energia renovável.
Projetos de energia tramitando
A modernização estatal em torno do setor foi a pauta central da reunião de maio do Conselho de Sustentabilidade da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP). As discussões abordaram os pontos de atenção a três Projetos de Lei (PLs) sobre energia que tramitam no Congresso Nacional: a conversão em lei da Medida Provisória (MP) 1.212/2024 — cujo objetivo é conter os aumentos nas contas de energia elétrica dos consumidores do sistema cativo —; o PL 2.308/2023, que busca instituir o Marco Legal do Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono; e o PL 576/2021, que visa ao aproveitamento de potencial energético offshore.
“A meu ver, ocorre uma falta de sincronia entre o Congresso Nacional e o Ministério de Minas e Energia (MME). Tenho dificuldade de acompanhar o que está acontecendo porque não vejo nenhuma orientação central. Há vários PLs contraditórios e que produzem ações que colidem com outras atividades. Os eventos climáticos estão se tornando cada vez mais frequentes, e é preciso agir. A legislação precisa mudar. É necessário criar mecanismos de compensação financeira por prejuízos causados por muitas horas seguidas sem eletricidade, especialmente para a população de baixa renda e para os pequenos comércios”, avaliou José Goldemberg, presidente do Conselho de Sustentabilidade.
Outra preocupação especialmente destacada foi acerca dos contratos de concessão com vencimentos de 2025 a 2031, que correspondem a 62% de distribuição do País (só no Estado de São Paulo, são cinco distribuidoras). Uma consulta pública foi aberta em 2023, por meio do MME, e, até agora, não há sequer um relatório com o retorno das contribuições realizadas — tampouco se foram aceitas ou não. O que se constata é que, mesmo com indicadores de qualidade adequados, o consumidor sente que o serviço de fornecimento de energia não está tão bom. As contribuições foram robustas, consistentes e se esperava que o ministério se adiantasse. “A situação é preocupante. Temos um parecer com sugestões de melhorias para esses contratos de concessão. Não importa se será uma prorrogação ou licitação, é fundamental definir adequadamente os termos de verificação de desempenho de prestação de serviços que serão inseridos”, afirmou a assessora Cristiane Cortez.
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Contenção de aumento da conta de energia elétrica
Em relação à MP que visa à redução nas contas de energia elétrica dos consumidores do sistema cativo, a FecomercioSP ressalta atenção ao fim dos aportes anuais e da quitação antecipada dos empréstimos às distribuidoras. Um ponto negativo é o artigo 1º de prorrogação de prazo de 36 meses para desconto de TUSD e TUST de empreendimentos de geração de energias renováveis (biomassa, eólica, solar etc.). Já o ponto positivo é a redução do reajuste das tarifas da Região Norte. “Faz-se necessária uma regulamentação do setor elétrico via PL, com tramitação ordinária e realização de audiências públicas em razão da grandiosidade e da importância do tema. Além disso, é preciso vetar a apresentação de emendas fora do escopo de MPs propostas pelo Executivo para evitar a inserção de ‘jabutis’”, reiterou Goldemberg.
Hidrogênio de baixo carbono
No caso da análise do PL do hidrogênio de baixo carbono — conhecido também como hidrogênio verde (H2V) —, a equipe vê como adequado o Brasil ter um Marco Legal para disciplinar a inserção do hidrogênio como fonte de energia. Contudo, alguns pontos preocupam, como a previsão de grande quantidade de incentivos tributários e regulatórios que podem impactar a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) e a conta de energia elétrica do consumidor; a falta de menção da indústria verde a partir do H2V; o alto teto de emissão de dióxido de carbono (CO2); e o grande uso de água e eletricidade na produção do elemento químico, além da carência de aspectos socioambientais como requisito para incentivos do Regime Especial de Incentivos para a Produção de Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono (Rehidro). “Hidrogênio requer ainda muito investimento em P&D [Pesquisa & Desenvolvimento], e não pode desperdiçar recursos para ser um mero exportador de H2V para tornar verdes as indústrias de fertilizantes do exterior.”, diz Goldemberg.
Energia Elétrica offshore
O posicionamento a respeito do PL 576/2021 foi contrário. Em análise, entende-se que o Brasil não precisa explorar a geração de energia offshore. Além disso, o Marco Regulatório é desnecessário, pois o País ainda tem espaço para novos empreendimentos de geração de energia, incluindo diversas usinas eólicas e solares já outorgadas. “Consideramos o entrave econômico o principal problema da geração offshore — o alto custo de linhas de transmissão para trazer a eletricidade para o continente, pois os geradores estariam situados a muitos quilômetros, sendo que o País ainda tem espaço e capacidade de implementar novos empreendimentos renováveis em terra firme. Ainda, o PL é bastante prejudicial aos consumidores, em decorrência dos “jabutis” inseridos, como a prorrogação de contratação de usinas térmicas a carvão mineral até 2050, a liberação do preço-teto para térmicas a gás nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e as contratações de energia [250 MW provenientes do hidrogênio líquido a partir do etanol na Região Nordeste, e 300 MW de eólicas na Região Sul]”, destacou Goldemberg.
Acompanhe todas as atividades e ações da FecomercioSP rumo à sustentabilidade por este link.
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